HISTÓRICO
O Conselho Indígena de Roraima (CIR) foi pioneiro na criação de um departamento jurídico dentro de uma organização indígena no Brasil. Com 30 anos de atuação, o departamento teve como primeiros advogados o Dr. Paulo Pankararu, e Joenia Wapichana, a primeira advogada mulher indígena. Além deles, a equipe contou com a colaboração de advogados não indígenas, como Guilherme, Alexander Sena, Maria Luiza e a advogada aliada Dra. Ana Paula.
A atuação dos advogados, especialmente da Dra. Joênia Wapichana, foi fundamental para a garantia dos direitos territoriais dos povos indígenas de Roraima e do Brasil, principalmente na defesa da homologação da TI Raposa Serra do Sol.
Até março de 2025, a equipe do Departamento Jurídico do CIR contou com a atuação do Dr. Ivo Macuxi, além das estagiárias de Direito Zuli Kaimem e Carla Jarraira.
ÁREA DE ATUAÇÃO
A atuação do departamento jurídico abrange tanto a defesa judicial quanto extrajudicial dos direitos coletivos dos povos indígenas, em todas as instâncias do judiciário brasileiro e nas cortes internacionais. Esse trabalho está estruturado em quatro eixos principais: A)DEFESA DOS DIREITOS TERRITORIAIS E AMBIENTAIS. B)PROTEÇÃO E GOVERNANÇA TERRITORIAL; C)FORMAÇÃO JURÍDICA. D). ADVOCACIA INDÍGENA.
Assessoria jurídica a 263 comunidades associadas ao CIR e parceiras, abrangendo 36 terras indígenas de Roraima e atendendo direta e indiretamente mais de 40 mil indígenas. A principal atuação continua sendo a defesa dos direitos territoriais, com ênfase na demarcação das terras indígenas. Além disso, orientação às lideranças sobre vários temas, como denúncias de invasão de terras, fortalecimento do sistema jurídico indígena , meio ambiente, direitos humanos, direito a consulta, e entre outros.
Também atuamos na assessoria institucional, realizando a análise de contratos e tratando de assuntos relacionados ao CIR. Além disso, prestamos assessoria à Assembleia Geral dos Povos Indígenas e à Coordenação Ampliada Deliberativa do CIR, garantindo o suporte jurídico necessário para a tomada de decisões.
EQUIPE
Atualmente, a equipe do departamento jurídico do CIR é composta por dois advogados indígenas: Júnior Nicácio Wapichana e Fernanda Félix Wapichana. Além disso, a equipe conta com dois estagiários indígenas de Direito, Bárbara Macuxi e Luciano Wapichana. A coordenação do departamento está sob a responsabilidade do advogado Júnior Nicácio.
Em 2024, a assessoria jurídica do CIR recebeu reconhecimento nacional ao ser premiada na 21ª edição do Prêmio Innovare, destacando a excelência do trabalho desenvolvido em defesa dos direitos indígenas, através da formação dos operadores indígenas de direito.
MARCOS IMPORTANTES NA DEFESA DOS DIREITOS INDÍGENAS
CASO OVELÁRIO TAMES: O caso Ovelário Tames representa um marco na luta pelos direitos indígenas no Brasil, contra a violência policial e a impunidade. Ovelário Tames, um jovem Macuxi, foi detido por policiais civis do Estado de Roraima em 23 de outubro de 1988 e, no dia seguinte, foi encontrado morto em uma cela da delegacia de polícia do município da Normandia. Em 24 de fevereiro de 1999, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) publicou o Relatório de Mérito nº 10/99, responsabilizando o Estado brasileiro pela violação dos direitos à vida, à liberdade, à segurança e à integridade física. O relatório determinava a instalação de uma placa em homenagem ao jovem no centro da cidade de Boa Vista, como símbolo de combate à discriminação, à intolerância e à impunidade. Entre outras medidas recomendadas, destacam-se a criação da Defensoria Pública da União (DPU) e o apoio ao projeto “Balcão de Direitos”, no valor de 90 mil reais, destinado à formação de lideranças e à obtenção de documentos. Além disso, foi determinada a indenização da família do jovem no valor de 90 mil reais.
JULGAMENTO DA TI RAPOSA SERRA DO SOL NO STF: Em 2009, a advogada indígena Joenia Wapichana, do departamento jurídico do CIR, realizou uma sustentação oral no Supremo Tribunal Federal (STF), defendendo a homologação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol de forma integral, conforme estabelecido no decreto de homologação. A Corte confirmou a demarcação integral da área, abrangendo 1.747.464 hectares, legalizando sua constitucionalidade e reafirmando a posse tradicional e originária dos povos Macuxi, Taurepang, Wapichana, Patamona e Sapará.
CASO RAPOSA SERRA DO SOL NA CIDH/OEA: Em 29 de março de 2004, o Conselho Indígena de Roraima – CIR e a Rainforest Foundation-US apresentaram uma denúncia perante a CIDH contra a República Federativa do Brasil por violações aos direitos humanos dos povos indígenas da T.I Raposa Serra do Sol, e incidentes violentos e severa de degradação ambiental que teriam afetado a vida, e a integridade dos povos indígenas daquela TI. Em 6 de dezembro de 2004, em resposta ao pedido do CIR e da Rainforest Foundation-US, a CIDH expediu medidas cautelares (MC-818-04) para proteger a integridade física dos povos indígenas da TI RSS, garantindo medidas urgentes de proteção até a conclusão do processo de demarcação. Em 2024, ocorreu uma audiência com a Comissão Interamericana, na qual o CIR reafirmou as denúncias e apresentou novos elementos sobre a situação dos povos indígenas da TI RSS. Atualmente, a CIR aguarda a emissão do relatório de mérito pela CIDH.
INDENIZAÇÃO AOS POVOS INDÍGENAS DA RAPOSA SERRA DO SOL: Como parte de um processo de reparação histórica pelos atos de discriminação e preconceito contra os povos indígenas de Roraima, as comunidades das Terras Indígenas Raposa Serra do Sol e São Marcos receberam o valor de R$ 896 mil. Esse valor foi resultado de uma indenização por danos morais coletivos, decorrente de uma ação movida pelo Ministério Público Federal (MPF) contra o jornalista e documentarista Luiz Margarido e, à época, o coronel do Exército Cláudio Barbosa de Figueiredo ( APELAÇÃO CÍVEL N° 2009.42.00.000288-9/RR; Processo na Origem: 2887520094014200). O processo teve início a partir da solicitação das comunidades indígenas, sendo o pedido formalmente encaminhado pelo Conselho Indígena de Roraima (CIR) ao Ministério Público Federal (MPF), que adotou as medidas cabíveis para a responsabilização dos envolvidos.
ATUAÇÃO NO STF SOBRE CASO MARCO TEMPORAL: A assessoria jurídica tem atuado de forma ativa como amicus curiae no caso Xoktlen, que buscava regulamentar a tese do marco temporal. A atuação foi para garantir que os direitos territoriais dos povos indígenas sejam respeitados conforme a Constituição Federal, que estabelece que esses direitos são originários e não dependem de data ou evento específico para serem reconhecidos e garantidos. A atuação buscou reforçar a proteção e o reconhecimento dos direitos territoriais indígenas, combatendo a tentativa de limitar esses direitos com base em uma interpretação restritiva do marco temporal.
DEFESA DOS DIREITOS TERRITORIAIS: A assessoria jurídica tem atuado de forma decisiva na defesa e acompanhamento dos processos de demarcação das Terras Indígenas (TIs) Anzol, Arapuá e Anaro, que solicitam o reconhecimento e a demarcação de seus territórios. Além disso, a atuação tem sido fundamental nas áreas que ficaram de fora da demarcação, como Manoá/Pium, Pium e Truaru. A equipe jurídica também tem trabalhado para evitar reintegração de posse e transferir esses processos da justiça estadual para a justiça federal, que é a instância competente para tratar dos direitos dos povos indígenas. No caso da TI Anaro, a justiça federal assegurou o direito de posse tradicional aos povos indígenas da região, que aguardam a remoção dos invasores. Em relação à TI Arapuá, foi formado um Grupo de Trabalho (GT) para iniciar os estudos de identificação da área e dar sequência ao processo de demarcação. Em Roraima, a maioria das terras indígenas foi demarcada na década de 1980, com base em um modelo de integração forçada, e em “ ilhas” que não respeitava a posse tradicional das comunidades, conceito que só foi superado em 5 de outubro de 1998, com a promulgação da nova Constituição Federal.
APLICAÇÃO DOS REGIMENTOS INTERNOS COMUNITÁRIOS: Por meio do fortalecimento da governança territorial e da aplicação das normas comunitárias, mais um caso que chegou à Justiça Comum resultou no reconhecimento do Regimento Interno da Comunidade Pium, localizada na Serra da Lua, que aplicou penalidades a um indígena conforme as regras estabelecidas pela própria comunidade (Ação Penal n.° 0800305-63.2017.8.23.0090). Além desse caso, a Justiça também reconheceu a forma tradicional de resolução de conflitos em outras comunidades indígenas, como Manoá (TJ-RR, Apelação Criminal 0090.10.000302-0) e Maturuca, validando os mecanismos de justiça indígena e respeitando os direitos das comunidades em resolver suas questões de maneira autônoma e conforme suas tradições.